quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Gasto do governo federal em saúde nunca foi tão alto

 Colunas

Vinícius Torres Freire escreve aos domingos, quartas e sextas-feiras.

A despesa do governo federal com saúde jamais foi tão alta. Era provável que aumentasse sob Luiz Inácio Lula da Silva, pois, com o novo arcabouço fiscal, voltou a vinculação do gasto com saúde à receita; o governo de resto não diminuiria gastos ditos discricionários. Foi a 1,83% do PIB, nos últimos 12 meses. No início de Lula 3, era de 1,37% do PIB. Na média de 2009 a 2019, de 1,47% do PIB.

Em dinheiro, foi um aumento de quase R$ 60 bilhões desde o início deste governo, para R$ 209 bilhões, excluídos gastos com salários e aposentadorias de servidores (valores corrigidos pela inflação). É mais do que se destina ao Bolsa Família, que levou R$ 171 bilhões nos últimos 12 meses. Nos grandes agregados da despesa federal, o gasto com saúde fica atrás de Previdência (INSS), que leva 8,35% do PIB, e de Pessoal (salários, benefícios, aposentadorias), com 3,48%. A receita total do governo foi de 18,17% do PIB nos últimos 12 meses. A despesa, de 20,21%.

O déficit primário, pois, está em torno de 2% do PIB (não inclui o gasto com juros). Mesmo descontando gambiarras, o déficit deste ano será bem menor do que o previsto por "o mercado". Mas o problema ainda será crônico por anos a fio.

Aumento tão expressivo de despesa em tão pouco tempo deveria tornar mais incontornável uma análise detalhada de eficiência, o que é ainda mais difícil, neste caso, até por exigir tempo longo de observação. Além do mais, estados e municípios também gastam, resultados dependem de fatores além da intervenção direta na saúde etc. Separar causas e resultados é bem enrolado.

Enfim, gasto com saúde é na prática um saco sem fundo. Sempre se pode dizer que falta recurso, a depender do padrão de atendimento que se queira oferecer (e o nosso padrão é precário e desigual). Em termos de tecnologia e terapias, o céu é o limite.

Ainda assim, será interessante saber o que está sendo e será feito do dinheiro, se em atendimento ou prevenção, se em investimento ou não, como a aplicação dos recursos é coordenada com gastos e providências estaduais e municipais.

O governo, porém, vai dar ter de imaginar logo como lidar com a perspectiva de aumento ainda maior da despesa com saúde. Por determinações constitucionais, vai crescer mais do que o conjunto dos gastos federais. Se há teto para o crescimento do total da despesa e algumas delas crescem mais do que o permitido pelo teto (com Previdência ou saúde), algum outro gasto será achatado, como todo o mundo já deve saber. O achatamento deve ocorrer no investimento em obras, equipamentos, que até cresceu sob Lula 3, mas vai estar sujeito ao arrocho. Além de problema em si, pois a infraestrutura do país é uma desgraça, o arrocho do investimento limita o dinheiro destinado a emendas parlamentares.

Tudo isso é sabido, mas faz uns meses tem se ignorado o elefante na sala. Fernando Haddad queria lidar com o assunto desde o início de Lula 3. Simone Tebet, ministra do Planejamento, diz que a discussão volta à mesa em 2025. Causa imensa revolta a ideia de limitar o crescimento de despesas federais com saúde, educação e Previdência. Mas apenas aumento contínuo de imposto e "milagre do crescimento" empurrariam o problema para a frente. E, não, pagar menos juros (que são "pagos" com mais dívida) não resolve a questão.

Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA)

Fonte: https://ootimista.com.br/

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