RIO - O “nevoeiro mental” frequentemente experimentado
por pacientes de câncer de mama após a quimioterapia pode ser devido mais ao
estresse pós-traumático do que em razão dos medicamentos usados contra o
câncer, sugere um novo estudo publicado recentemente no “ Journal of the
National Cancer Institute”.
- Pacientes que se queixam de problemas cognitivos podem
na verdade estarem sofrendo com estresse pós-traumático ou outras consequências
psicológicas substanciais advindas do fato de terem câncer, que pode ser
tratado - afirmou Kerstin Hermelink, médica do do Hospital Universitário CCCLMU
de Munique, Alemanha, à agência Reuters Health. - Os médicos devem, portanto,
ouvir atentamente seus pacientes que se queixam de deficiências cognitivas e
tentar compreender a sua situação individual para descobrir o que este paciente
precisa - acrescentou.
Os efeitos da quimioterapia no cérebro foram inicialmente
responsabilizados pela “névoa mental” às vezes experimentada por mulheres com
câncer de mama, mas sintomas semelhantes foram relatados por pacientes com
câncer de mama que ainda não haviam começado a sua quimioterapia e até mesmo
por aquelas cujo tratamento não incluía quimioterapia, observaram Hermelink e
colegas no estudo.
Para investigar o porquê disso, os pesquisadores
estudaram 150 mulheres que acabavam de ser diagnosticadas com câncer de mama,
assim como 56 mulheres sem problemas de saúde. Em vários momentos ao longo do
ano seguinte, as mulheres completaram exames neuropsicológicos, bem como
avaliações para o transtorno de estresse pós-traumático (PTSD, na sigla em
inglês). Elas também forneceram suas próprias avaliações sobre sua função
cognitiva.
Cerca de sete meses após o início do estudo (e cerca de
dois meses após a conclusão da quimioterapia para as mulheres que a receberam),
não houve diferenças no desempenho cognitivo ou mudanças cognitivas entre as
mulheres que receberam quimioterapia, mulheres cujo câncer de mama não foi
tratado com quimioterapia e as mulheres saudáveis sem câncer de mama. No
final de um ano, no entanto, houve um pequeno declínio cognitivo nas pacientes
de câncer de mama na comparação com as mulheres saudáveis, mas o declínio não
dependeu se elas haviam sido submetidas ou não ao tratamento de quimioterapia.
Em vez disso, esta perda estava ligada aos sintomas do PTSD.
Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados
Unidos definem o PTSD como “"uma intensa resposta física e emocional aos
pensamentos e lembranças do evento que dura por muitas semanas ou meses após o
evento traumático”. Os sintomas são variados e incluem - mas não estão
limitados a - flashbacks, pesadelos, dificuldade para dormir, estar
excessivamente alerta ou facilmente assustado, e ter problemas para se
concentrar.
- Eu, pessoalmente, fiquei surpreso com a pouca mudança
cognitiva que observamos - disse Hermelink. - Todas as diferenças entre os dois
grupos de pacientes e o grupo de controle foram mínimas, mesmo que usássemos
uma bateria de teste grande e nosso estudo foi comparativamente bem alimentado,
com uma grande amostra.
Diante disso, ela acrescenta:
- Os médicos devem dizer aos seus pacientes que a
deficiência cognitiva muito sutil não só é observada após a quimioterapia, mas
também em pacientes tratadas sem quimioterapia, e mesmo em pacientes que ainda
não iniciaram qualquer tratamento para o câncer da mama. O cérebro não é uma
máquina que oferece sempre o mesmo nível de desempenho, desde que não esteja
quebrado, mas sua função e, a longo prazo, também sua estrutura, são afetadas
por nossas ações e experiências. O diagnóstico de uma doença com risco de vida
como o câncer de mama vem como um choque para a maioria das pacientes, o que
pode deixar vestígios no cérebro, mesmo que elas lidem muito bem com isso.
Por fim, Hermelink considera:
- A investigação sobre o prejuízo cognitivo associado ao
câncer está cheia de armadilhas metodológicas que podem distorcer
substancialmente os resultados. É quase impossível para as pessoas que não
trabalham no campo avaliarem a qualidade metodológica de um estudo e, assim,
descobrirem se os resultados são ou não válidos. Estudos com achados
espetaculares são relativamente fáceis de publicar, mesmo que sejam pequenos e
seus métodos questionáveis, e é claro que todos os pesquisadores precisam
publicar. Os jornalistas e o público devem, portanto, ficarem particularmente
cautelosos com pequenos estudos que apontam grandes e inequívocos efeitos.
Fonte: O Extra
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