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A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou uma nova indicação terapêutica para o imunoterápico nivolumabe: o tratamento de pacientes com câncer renal metastático previamente tratados. A aprovação desse anticorpo monoclonal de imunoglobulina G4 (IgG4) totalmente humano foi baseada no estudo de fase III CheckMate 025[1]. O nivolumabe é classificado como um inibidor de checkpoint, que age ao se ligar ao receptor de morte programada 1 (PD-1, do inglês Programmed Death 1), uma proteína expressa em células T ativadas, e bloqueia sua interação com às proteínas ligantes PD-L1 (PD-1 ligand) e PD-L2 (PD-2 ligand), expressas em células do sistema imune e tumorais. A interação entre PD-1 e PD-L1 ou PD-L2 geralmente inibe a resposta imunitária celular[1]. Ao mesmo tempo, ao bloquear essa interação, o imunoterápico potencializa as respostas das células T, o que inclui respostas antitumorais.
Durante a fase III do CheckMate 025[1], 821 pacientes com carcinoma avançado de células renais com o subtipo histológico de células claras que haviam sido tratados previamente com um ou dois regimes de terapia antiangiogênica foram designados de forma aleatória para receber 3 mg de nivolumabe por quilograma de peso corporal intravenoso a cada duas semanas (N=410) ou 10 mg de everolimo administrado por via oral uma vez por dia (N=411). O everolimo é um inibidor do alvo da rapamicina nos mamíferos (mTOR).
A pesquisa mostrou que a sobrevida global mediana foi maior em sujeitos que receberam o nivolumabe do que naqueles tratados com everolimo (25 meses contra 19,6 meses) [1]. O grupo tratado com nivolumabe também teve uma taxa de resposta objetiva maior (25% contra 5%) e menos eventos adversos relacionados ao tratamento grau 3 ou 4 (19% contra 37%).
Panorama no Brasil
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No Brasil, a medicação já estava aprovada para uso como monoterapia no tratamento de melanoma avançado (irressecável ou metastático) e para tratamento de câncer de pulmão de células não pequenas (NSCLC) localmente avançado ou metastático com progressão após quimioterapia à base de platina. No segundo caso, pacientes com mutação EGFR (no gene do receptor do fator de crescimento epidérmico) ou ALK (quinase do linfoma anaplásico) precisavam ter progredido após tratamento com anti-EGFR e anti-ALK antes de receber o medicamento. Quanto ao câncer renal, já há tratamentos aprovados pela Anvisa, inclusive para quadros metastáticos. Ele representa cerca de 2% a 3% das neoplasias malignas do adulto, com incidência de 7 a 10 casos por 100.000 habitantes nas regiões mais desenvolvidas do Brasil[2]. Mas, segundo o Dr. Cristiano Guedes, oncologista do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), não há uma conduta que possa ser considerada padrão para o tratamento desta neoplasia.
Segundo ele, para escolher a melhor opção, é importante considerar fatores relacionados ao paciente, como comorbidades, tipo histológico do tumor e dados clínicos e laboratoriais, principalmente fatores de risco prognósticos, uma vez que os critérios de inclusão não foram idênticos nos estudos clínicos realizados. Também é importante considerar o perfil de toxicidade de cada droga e, além disso, apesar de apenas alguns tratamentos terem sido comparados entre si no mesmo ensaio clínico, de forma randomizada, há alguns dados de eficácia que devem ser ponderados.
A quimioterapia citotóxica, de acordo com o Dr. Guedes, não é eficaz no tratamento do carcinoma de células renais e seu uso se limita aos tumores dos dutos coletores, de histologia medular a aos que possuem diferenciação sarcomatóide, apesar da pouca evidência científica para seu uso. "Durante muito tempo, os únicos tratamentos disponíveis eram as citocinas (interleucina-2 e interferon). Estas terapias apresentam toxicidades que afetam de forma considerável a qualidade de vida ou que são potencialmente fatais, sendo que não há um biomarcador que possa predizer quais os poucos pacientes que realmente podem se beneficiar", esclareceu ao Medscape.
Nos últimos anos, outras classes de medicamentos foram aprovadas para o tratamento do câncer de células renais metastático no país: os antiangiogênicos (inibidores de tirosina-quinase e um anticorpo monoclonal cujo alvo é o fator vascular de crescimento endotelial), os inibidores de mTOR e, mais recentemente, imunoterapia com os inibidores de checkpoint.
"Não se pode esquecer que, em casos selecionados, pode ser considerada a nefrectomia citorredutora paliativa, a ressecção de metástases ou mesmo o acompanhamento clínico inicial, com o início do tratamento medicamentoso quando for mais indicado", diz o Dr. Guedes.
Perspectivas para os inibidores de checkpoint
No CheckMate 025, os participantes investigados já tinham sido tratados com terapia antiangiogênica e esta falhou. Além disso, tinham um componente de células claras, subtipo histológico presente na maioria dos pacientes com carcinoma de células renais[2]. Segundo o Dr. Guedes, o subtipo histológico não-células claras possui características moleculares próprias. Mas, apesar disso, na prática clínica, seu tratamento em geral tem como base o dos pacientes com histologia células claras, possivelmente com menor eficácia.
"Não há, até o momento, um biomarcador que possa predizer quais pacientes irão se beneficiar do tratamento com nivolumabe. No estudo clínico, foi avaliada a expressão de PDL-1, que não se mostrou útil", afirmou, ressaltando que, em geral, os pacientes com doença autoimune não são candidatos à terapia com inibidores de checkpoint. Ele afirma também que, quando se trata desse tipo de inibidor, é importante estar alerta aos efeitos adversos imuno-mediados, que podem ocorrer em diversos órgãos e sistemas.
O Dr. Guedes alerta que o nivolumabe é um tratamento de custo extremamente elevado. "Embora, as recomendações atuais mandem que ele deva ser utilizado até a progressão da doença, não se sabe se uma menor duração do tratamento pode ser tão eficaz quanto", destaca e acrescenta: "mesmo em países como os Estados Unidos, o custo deste tratamento é preocupante, como descrito em um artigo da mesma edição do New England Journal of Medicine em que foram publicados os resultados do CheckMate 025[3]".
O nivolumabe, cujo nome comercial é Opdivo e é fabricado pela Bristol-Myers Squibb, teve seu preço aprovado pela Anvisa em julho de 2016. Com base na Lista de Preços de Medicamentos, o preço fabricante – teto de preço pelo qual um laboratório ou distribuidor pode comercializar no mercado brasileiro seu produto – para o frasco de nivolumabe de 10 mL varia de R$ 6.215,37 a R$ 8.014,04 e de R$ 2.486,15 a R$ 3.205,62 para o frasco de 4 mL (solução injetável de 10 mg/mL). A variação ocorre em função das diferentes alíquotas de ICMS.
Considerando um paciente com 70 kg, o custo mínimo de um tratamento mensal (duas doses de 210 mg) será superior a R$ 27.000. Nesse cálculo, foi considerado o regime de 3 mg/Kg a cada duas semanas por via intravenosa, tal como recomendado no CheckMate025 e aprovado no Brasil. Mas, em setembro de 2016, a Food and Drug Administration (FDA) dos EUA modificou a recomendação da dosagem de nivolumabe para o carcinoma de células renais, melanoma metastático e câncer de pulmão de células não pequenas. O regime passou para 240 mg por via intravenosa a cada duas semanas. Sob esse regime, o custo mínimo do tratamento mensal no Brasil será superior a R$ 31.000.
Referências
Motzer, RJ et al. Nivolumab versus Everolimus in Advanced Renal-Cell Carcinoma. N Engl J Med, 2015; 373:1803-1813. Disponível em: http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1510665#t=abstract
Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. Portaria N° 1.440, de 16 de dezembro de 2014. Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas do Carcinoma de Células Renais. Disponível em: http://conitec.gov.br/images/Artigos_Publicacoes/ddt_Carcinoma-CelRenais_2014.pdf
Quinn, DI e Lara, Jr. PN. Renal-Cell Cancer — Targeting an Immune Checkpoint or Multiple Kinases. N Engl J Med, 2015; 373:1872-1874. Disponível em: http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMe1511252#t=article
Fonte: Teresa Santos e Dra. Ilana Polistchuck
Medscape
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